sexta-feira, 18 de abril de 2014

Sozinhos no Universo

Entrou em casa e largou suas coisas numa poltrona, avisando em voz alta que havia chegado. Sem ouvir resposta, foi até a cozinha lavar as mãos. Pela janela em cima da pia, ele a viu no alto da pequena colina próxima, olhando pensativamente para as estrelas. Saiu para a noite clara pela porta dos fundos e atravessou o gramado. Subiu calmamente a colina e parou ao lado dela.
— Ficou sabendo da descoberta de hoje? — perguntou ela tranquilamente, sem tirar os olhos do céu.
— Do planeta? Fiquei, sim. Praticamente do mesmo tamanho do nosso, está na zona habitável de sua estrela e possui água no estado líquido. Excitante, não?
Ela virou para olhá-lo e sentiu um calor no peito ao vê-lo com um sorriso acolhedor no rosto.
— Pena que esteja tão longe. Qual a distância mesmo? — perguntou ele.
— Não lembro exatamente, sei apenas que uma simples troca de mensagens levaria milhares de anos para acontecer. Se houver vida inteligente, claro — adicionou rapidamente, falhando miseravelmente na tentativa de parecer ponderada.
— Tarefa para nossos descendentes, então — disse ele, acariciando a barriga dela.
— Ainda assim, na escala astronômica, a distância é ridiculamente pequena. Já imaginou? Vida na nossa galáxia. — Ela voltou a olhar para o céu e ele pôde ver o brilho em seus olhos. — Não num lugar longínquo do Universo, na nossa galáxia! No nosso “quintal”. Se a vida (mesmo com centenas de bilhões de galáxias, cada uma com centenas de bilhões de estrelas, que por sua vez possuem sabe-se lá quantos planetas em suas órbitas) achar por bem aparecer num planeta vizinho ao nosso, seria seguro supor que o Universo inteiro esteja transbordando de vida! Em todos os cantos e de todas as formas. Uma expansão gigantesca dos nossos horizontes. Imagine as diferentes culturas, as diferentes crenças, as histórias das civilizações, as espécies e anatomias, as línguas, as guerras e sistemas políticos, o desenvolvimento científico e tecnológico, as invenções, os bons e maus momentos, os heróis e os vilões, os artistas e as obras.
— Nem me fale, querida. Ainda tenho uma infinidade de livros para ler que foram escritos por aqui mesmo e você aí querendo aumentar a lista indefinidamente.
— Besta — disse, rindo. Ela baixou os olhos para o chão e subitamente ficou séria, esforçando-se para acreditar em suas próximas palavras: — Tenho certeza de que alguém em algum lugar do Universo está neste momento olhando para as estrelas e pensando exatamente nas mesmas coisas.
Mas ela não tinha. Como poderia quando o Universo respondia apenas com o silêncio? Continuou olhando para baixo e se deixou tomar pela ideia da solidão e do vazio cercando-os. Percebendo seu conflito interno, ele logo tratou de distraí-la.
— Olha que bonito, amor. Whovian e Trekker já estão se pondo — disse ele, apontando para o horizonte.
A noite foi ficando mais escura e uma brisa começou a soprar. Ainda no alto da colina, os dois entrelaçaram suas caudas carinhosamente e observaram em silêncio as duas luas tocarem o horizonte e desaparecerem sob ele.

2 comentários:

  1. Devia escrever um livro! Muito bom!

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    1. Livro? Quem me dera. Talvez bem mais pra frente. =)
      Obrigado, Reinaldo! Fico feliz que tenha gostado.

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